quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Trecho de "Hamlet", Shakespeare


Onde há um salgueiro que se inclina sobre o arroio

E espalha as folhas cinza na corrente vítrea,

Ela fazia umas grinaldas fantasiosas,

Tecendo as folhas do chorão com margaridas,

Ranúnculos, urtigas, e as compridas flores

De cor purpúrea que os pastores, sem modéstia,

Chamam com um nome forte, mas que as nossas virgens

Conhecem, castas, como “dedos-de-defunto”.

Galgando a árvore com o fim de pendurar

Essa coroa vegetal nos ramos pensos,

Maldoso um galho se partiu, e ela tombou

Com seus troféus herbóreos no plangente arroio.

Abriram-se-lhe em torno as vestes, amplamente,

Mantendo-a à tona qual sereia, por instantes:

E ela cantava trechos de canções antigas,

Como que sem noção do transe em que se achava,

Ou como criatura que, nascida na água,

A esse elemento fosse afeita. Mas, em breve,

As suas vestes, já embebidas e pesadas,

Levaram a infeliz, do canto melodioso

Para lodosa morte.

domingo, 22 de novembro de 2009

Fumaça de Cigarro



Queria poder dizer qual foi a hora exata em que nos perdemos.
Quando foi que as nossas mãos se soltaram
E não olharam para trás, para ver o que ficou;

Quando os antigos cigarros transformaram-se somente em fumaça
Deixando no ar o cheiro de um passado próximo,
E os gritos da festa transformaram-se em um pesado silêncio.

Poderia dizer por que levou tanto tempo para sentirmos?
Por que o orgulho por tanto tempo afogou este sentimento,
E só agora ele dói?

O certo é que já não somos parte de um todo,
As mão separadas não se unem mais,
E a fumaça não pode voltar a ser cigarro.



terça-feira, 17 de novembro de 2009

Trecho de "Romeu e Julieta" Shakespeare


"Nesse lugar freqüentemente é visto,
A tentar engrossar com as lágrimas que chora
O fresco pranto matinal da aurora,
E as nuvens com a fumaça dos suspiros.
Logo, porém, que o sol, que alegra a todos,
No mais longínquo extremo do oriente
Do leito da manhã abre a escura cortina,
Meu filho, cheio de melancolia,
Para fugir da luz, vem para casa
E, fechando as janelas do seu quarto,
Cria artificialmente para si
Uma noite mais negra à luz do dia."



quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Apesar de você, Chico Buarque



"Você que inventou esse estado, e inventou de inventar toda escuridão
Você que inventou o pecado, esqueceu-se de inventar o perdão"


sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Áspero amor, Pablo Neruda




Áspero amor, violeta coroada de espinhos,
cipoal entre tantas paixões eriçado, lança das dores,
corola da cólera, por que caminhos
e como te dirigiste a minha alma?


Por que precipitaste teu fogo doloroso, de repente,
entre as folhas frias do meu caminho?
Quem te ensinou os passos que até mim te levaram?
que flor, que pedra, que fumaça
mostraram minha morada?


O certo é que tremeu noite pavorosa,
a aurora encheu todas as taças com teu vinho
e o sol estabeleceu sua presença celeste,


enquanto o cruel amor sem trégua me cercava,
até que lacerando-me com espadas
e espinhos abriu no coração um caminho queimante.


segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Canção Para Uma Valsa Lenta, Mário Quintana



Minha vida não foi um romance...
Nunca tive até hoje um segredo.
Se me amas, não digas, que morro
De surpresa... de encanto... de medo...

Minha vida não foi um romance...
Minha vida passou por passar.
Se não amas, não finjas, que vivo
Esperando um amor para amar.


Minha vida não foi um romance...
Pobre vida... passou sem enredo...
Glória a ti que me enches a vida
De surpresa, de encanto, de medo!

Minha vida não foi um romance...
Ai de mim... Já se ia acabar!
Pobre vida que toda depende
De um sorriso... de um gesto... um olhar...

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Profecias, Raul Seixas


Tem dias que a gente se sente
Um pouco, talvez, menos gente

Um dia daqueles sem graça

De chuva cair na vidraça

Um dia qualquer sem pensar

Sentindo o futuro no ar

O ar, carregado sutil

Um dia de maio ou abril

Sem qualquer amigo do lado

Sozinho em silêncio calado

Com uma pergunta na alma
Por que nessa tarde tão calma

O tempo parece parado?

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

A morte dos girassóis, Caio Fernando Abreu




Mudando de assunto sem mudar propriamente, tenho aprendido muito com o jardim. Os girassóis, por exemplo, que vistos assim de fora parecem flores simples, fáceis, até um pouco brutas.

Pois não são. Girassol leva tempo se preparando, cresce devagar enfrentando mil inimigos, formigas vorazes, caracóis do mal, ventos destruidores. Depois de meses, um dia pá! Lá está o botãozinho todo catita, parece que já vai abrir.

Mas leva tempo, ele também, se produzindo. Eu cuidava, cuidava, e nada. Viajei por quase um mês no verão, quando voltei, a casa tinha sido pintada, muro inclusive, e vários girassóis estavam quebrados. Fiquei uma fera. Gritei com o pintor: “Mas o senhor não sabe que as plantas sentem dor que nem a gente?” O homem ficou me olhando tão pálido quanto aquele vizinho. Não, ele não sabe, entendi. E fui cuidar do que restava, que é sempre o que se deve fazer.

Porque tem outra coisa: girassol quando abre flor, geralmente despenca. O talo é frágil demais para a própria flor, compreende? Então, como se não suportasse a beleza que ele mesmo engendrou, cai por terra, exausto da própria criação esplêndida. Pois conheço poucas coisas mais esplêndidas, o adjetivo é esse, do que um girassol aberto.


Caio Fernando Abreu

domingo, 6 de setembro de 2009

Vai Passar, Chico Buarque


"...Dormia
A nossa pátria mãe
tão distraída
Sem perceber que era
subtraída
Em tenebrosas
transações

Seus filhos
Erravam cegos pelo
continente
Levavam pedras feito
penitentes
Erguendo estranhas
catedrais
E um dia, afinal
Tinham direito a uma
alegria fugaz
Uma ofegante epidemia
Que se chamava carnaval
O carnaval, o carnaval..."

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Bilhete, Mário Quintana

Se tu me amas,
ama-me baixinho.

Não o grites de cima dos telhados,
deixa em paz os passarinhos.

Deixa em paz a mim!

Se me queres,
enfim,

.....tem de ser bem devagarinho,
.....amada,

.....que a vida é breve,
.....e o amor
.....mais breve ainda.

Mario Quintana

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Ana Terra, parte d'O Continente, Veríssimo


Ana sentia-se animada, com vontade de viver, sabia que por piores que fossem as coisas que estavam por vir, não podiam ser tão horríveis como as que já tinha sofrido. Esse pensamento dava-lhe uma grande coragem. E ali deitada no chão a olhar para as estrelas, ela se sentia agora tomada por uma resignação que chegava quase a ser indiferença. Tinha dentro de si uma espécie de vazio: sabia que nunca mais teria vontade de rir nem de chorar. Queria viver, isso queria, e em grande parte por causa de Pedrinho, que afinal de contas não tinha pedido a ninguém para vir ao mundo. Mas queria viver também de raiva, de birra. A sorte andava sempre virada contra ela. Pois Ana estava agora decidida a contrariar o destino. Ficara louca de pesar no dia em que deixara Sorocaba para vir morar no Continente. Vezes sem conta tinha chorado de tristeza e de saudade naqueles cafundós. Vivia com o medo no coração, sem nenhuma esperança de dias melhores, sem a menor alegria, trabalhando como uma negra, e passando frio e desconforto... Tudo isso por quê? Porque era a sua sina. Mas uma pessoa pode lutar contra a sorte que tem. Pode e deve. E agora ela tinha enterrado o pai e o irmão e ali estava, sem casa, sem amigos, sem ilusões, sem nada, mas teimando em viver. Sim, era pura teimosia. Chamava-se Ana Terra. Tinha herdado do pai o gênio de mula.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Carta Anônima, Caio Fernando Abreu


"Tenho trabalhado tanto, mas penso sempre em você. Mais de tardezinha que de manhã, mais naqueles dias que parecem poeira assentada aos poucos e com mais força enquanto a noite avança. Não são pensamentos escuros, embora noturnos. Tão transparentes que até parecem de vidro, vidro tão fino que, quando penso mais forte, parece que vai ficar assim clack! e quebrar em cacos, o pensamento que penso de você. Se não dormisse cedo nem estivesse quase sempre cansado, acho que esses pensamentos quase doeriam e fariam clack! de madrugada e eu me veria catando cacos de vidro entre os lençóis. Brilham, na palma da minha mão. Num deles, tem uma borboleta de asa rasgada. Noutro, um barco confundido com a linha do horizonte, onde também tem uma ilha. Não, não: acho que a ilha mora num caquinho só dela. Noutro, um punhal de jade. Coisas assim, algumas ferem, mesmo essas são sempre bonitas. Parecem filme, livro, quadro. Não doem porque não ameaçam. Nada que eu penso de você ameaça. Durmo cedo, nunca quebra."

sábado, 1 de agosto de 2009

Mário Quintana, 103 anos.

Uma homenagem tardia pelo aniversário do Mário Quintana.



“Cecília, Vinícius, Manuel e Carlos sorriem mansinho, espiando Mário lá do céu, lá de cima.”

“Mas a Terra - tão azul assim, vista de longe, vista de cima - eles olham com pena. Sabem que pelo menos metade desse azul todo, depois que eles se foram, brota dali, do quartinho do Mário. Aí suspiram, tadinho, que barra!”

Caio Fernando Abreu

terça-feira, 21 de julho de 2009

Perfeição, Legião Urbana


"...Vamos celebrar nossa bandeira
Nosso passado de absurdos gloriosos
Tudo o que é gratuito e feio
Tudo que é normal
Vamos cantar juntos o Hino Nacional
(A lágrima é verdadeira)
Vamos celebrar nossa saudade
E comemorar a nossa solidão..."


domingo, 19 de julho de 2009

Canção da Garoa, Mário Quintana


Em cima do meu telhado,
Pirulin lulin lulin,
Um anjo, todo molhado,
Soluça no seu flautim.

O relógio vai bater;
As molas rangem sem fim.
O retrato na parede
Fica olhando para mim.

E chove sem saber por quê...
E tudo foi sempre assim!
Parece que vou sofrer:
Pirulin lulin lulin...

Diego Rivera


Retrato de mujer, 1944.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Semente do Amanhã, Gonzaguinha


Ontem um menino que brincava me falou
Que hoje é semente do amanhã...

Para não ter medo que este tempo vai passar...
Não se desespere não, nem pare de sonhar

Nunca se entregue, nasça sempre com as manhãs...
Deixe a luz do sol brilhar no céu do seu olhar!
Fé na vida, fé no homem, fé no que virá!

Nós podemos tudo,
Nós podemos mais
Vamos lá fazer o que será

terça-feira, 7 de julho de 2009

Maluco Beleza, Raul Seixas


Enquanto você se esforça prá ser
um sujeito normal
e fazer tudo igual

Eu do meu lado, aprendendo a ser louco
Um maluco total
na loucura real

Controlando a minha maluquez
misturada com minha lucidez

Vou ficar
ficar com certeza
maluco beleza


Este caminho que eu mesmo escolhi
É tão fácil seguir
por não ter onde ir

Controlando a minha maluquez
misturada com minha lucidez

Vou ficar
ficar com certeza
maluco beleza
Eu vou ficar...

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Da Vez Primeira que me Assassinaram, Mário Quintana


Da vez primeira em que me assassinaram
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha…
Depois, de cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha…

E hoje, dos meus cadáveres, eu sou
O mais desnudo, o que não tem mais nada…
Arde um toco de vela, amarelada…
Como o único bem que me ficou!

Vinde, corvos, chacais, ladrões da estrada!
Ah! Desta mão, avaramente adunca,
Ninguém há de arrancar-me a luz sagrada!

Aves da Noite! Asas do Horror! Voejai!
Que a luz, trêmula e triste como um ai,
A luz do morto não se apaga nunca!

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Vincent


Ando sem a mínima criatividade, estou sendo abrigada a pôr obras dos outros no blog e não as minhas por não ter o que mostrar.




quarta-feira, 1 de julho de 2009

Caçador de Pipas, Khaled Hosseini


"Eu me tornei o que sou hoje aos doze anos, em um dia nublado e gélido do inverno de 1975. Lembro do momento exato em que isso aconteceu, quando estava agachado por detrás de uma parede de barro parcialmente desmoronada, espiando o beco que ficava perto do riacho congelado. Foi há muito tempo, mas descobri que não é verdade o que dizem a respeito do passado, essa história de que podemos enterrá-lo. Porque, de um jeito ou de outro, ele sempre consegue escapar. Olhando para trás, agora, percebo que passei os últimos vinte e seis anos da minha vida espiando aquele beco deserto."

...

“Um dia, no verão passado, meu amigo Rahim Khan me ligou do Paquistão. Pediu que eu fosse vê-lo. Parado ali na cozinha, com o fone no ouvido, sabia muito bem que não era só Rahim Khan que estava do outro lado daquela linha. Era o meu passado de pecados não expiados.”

...

"Sentei em um banco do parque, perto de um salgueiro. Pensei em uma coisa que Rahim Khan disse um pouco antes de desligar, quase como algo que lhe houvesse ocorrido no último minuto. "Há um jeito de ser bom de novo." Ergui os olhos para as pipas gêmeas. Pensei em Hassan. Pensei em baba. Em Ali. Em Cabul. Pensei na vida que eu levava até que aquele inverno de 1975 chegou para mudar tudo. E fez de mim o que sou hoje."

sábado, 27 de junho de 2009

Menininho doente, Mário Quintana


Na minha rua há um menininho doente.
Enquanto os outros partem para a escola,
junto à janela, sonhadoramente,
ele ouve o sapateiro bater sola.

Ouve também o carpinteiro, em frente,
Que uma canção napolitana engrola.
E pouco a pouco, gradativamente,
o sofrimento que ele tem se evola...

Mas nesta rua há um operário triste:
não canta nada na manhã sonora,
e o menino nem sonha que ele existe.

Ele trabalha silenciosamente...
E está compondo este soneto agora
pra alminha boa do menino doente.

domingo, 21 de junho de 2009

Trecho d'O Gato Preto, Edgar Allan Poe

Não espero nem solicito o crédito do leitor para a tão extraordinária e no entanto tão familiar história que vou contar. Louco seria esperá-lo, num caso cuja evidência até os meus próprios sentidos se recusam a aceitar. No entanto não estou louco, e com toda a certeza que não estou a sonhar. Mas porque posso morrer amanhã, quero aliviar hoje o meu espírito. O meu fim imediato é mostrar ao mundo, simples, sucintamente e sem comentários, uma série de meros acontecimentos domésticos. Nas suas consequências, estes acontecimentos aterrorizaram-me, torturaram-me, destruíram-me. No entanto, não procurarei esclarecê-los. O sentimento que em mim despertaram foi quase exclusivamente o de terror; a muitos outros parecerão menos terríveis do que extravagantes. Mais tarde, será possível que se encontre uma inteligência qualquer que reduza a minha fantasia a uma banalidade. Qualquer inteligência mais serena, mais lógica e muito menos excitável do que a minha encontrará tão somente nas circunstâncias que relato com terror uma seqüência bastante normal de causas e efeitos.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

A cidade do sol, Khaled Hosseini


“Uma jovem Mariam está sentada junto á mesma, fazendo uma boneca á luz de uma lamparina a óleo. Esta cantarolando. Tem o rosto suave e juvenil, o cabelo foi lavado e está penteado para trás. E não lhe falta nenhum dente.

Laila a vê colar pedaços de lã na cabeça da boneca. Em poucos anos essa menina vai ser uma mulher que pede muito pouco da vida, que nunca incomoda ninguém, que nunca deixa transparecer que ela também tem tristezas, desapontamentos, sonhos que foram menosprezados. Uma mulher cuja generosidade, longe de ser contaminada, foi forjada pelas turbulências que se abateram sobre ela. Laila já consegue ver algo nos olhos daquela menina, algo tão arraigado que nem Rashid nem os talibãs conseguiriam destruir. Algo tão rijo e inacabável quanto um bloco de calcário. Algo que, afinal acabou sendo sua ruína e a salvação de Laila. A menina ergue os olhos. Deixa a boneca de lado. E sorri. - ‘Laila jo?’”

domingo, 14 de junho de 2009

In My Life, John Lennon

Em minha vida, eu amo mais a 'vocês'

Há lugares que eu vou me lembrar
Por toda a minha vida
Embora alguns tenham mudado
Alguns para sempre, e não para melhor
Alguns se foram e outros permanecem
Todos esses lugares tiveram seus momentos
Com amores e amigos, dois quais eu ainda posso me lembrar
Alguns estão mortos e outros estão vivendo
Em minha vida, já amei todos eles

Mas de todos esses amigos e amores
Não há ninguém que se compare a 'vocês'
E essas memórias perdem o sentido
Quando eu penso em amor como uma coisa nova
Embora eu saiba que eu nunca vou perder o afeto
Por pessoas e coisas que vieram antes
Eu sei que com frequência eu vou parar e pensar nelas
Em minha vida, eu amo mais a 'vocês'

Embora eu saiba que eu nunca vou perder o afeto
Por pessoas e coisas que vieram antes
Eu sei que com frequência eu vou parar e pensar nelas
Em minha vida, eu amo mais a 'vocês'

Em minha vida, eu amo mais a 'vocês'...

sábado, 13 de junho de 2009

A estrela, Manuel Bandeira


Vi uma estrela tão alta,
Vi uma estrela tão fria!
Vi uma estrela luzindo
Na minha vida vazia.

Era uma estrela tão alta!
Era uma estrela tão fria!
Era uma estrela sozinha
Luzindo no fim do dia.

Por que da sua distância
Para a minha companhia
Não baixava aquela estrela?
Por que tão alto luzia?

E ouvi-la na sombra funda
Responder que assim fazia
Para dar uma esperança
Mais triste ao fim do meu dia.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Cantiga para não morrer, Ferreira Gullar




Quando você for se embora,
moça branca como a neve,
me leve

Se acaso não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração

Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar

E se aí também não possa,
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento

terça-feira, 2 de junho de 2009

Soneto de Corifeu, Vinicius de Moraes


São demais os perigos desta vida
Para quem tem paixão, principalmente
Quando uma lua surge de repente
E se deixa no céu, como esquecida.

E se ao luar que atua desvairado
Vem se unir uma música qualquer
Aí então é preciso ter cuidado
Porque deve andar perto uma mulher.

Deve andar perto uma mulher que é feita
De música, luar e sentimento
E que a vida não quer, de tão perfeita.

Uma mulher que é como a própria lua:
Tão linda que só espalha sofrimento
Tão cheia de pudor que vive nua.

A menina que roubava livros


UMA ÚLTIMA NOTA DE SUA NARRADORA
Os seres humanos me assombram.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

O Pequeno Príncipe, Antoine de Saint-Exupéry

Vou falar de um clássico que muitos já leram, mas que vale a pena comentar.


A parte da raposa, na minha opinião é a parte mais bonita do livro

- Eu procuro amigos. O que quer dizer ‘cativar’?
- É algo quase esquecido- disse a raposa- significa ‘criar laços’...
- Criar laços?
- Exatamente, disse a raposa. Tu não és para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo…
...
- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E por isso eu me aborreço um pouco. Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. Os teus me chamarão para fora da toca, como se fosse música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo…”